sexta-feira, 8 de dezembro de 2017

A morte interior


Dói, né? Quando você sente algo te matar por dentro, mas aí você tem que agir como se isso nem afetasse você. - Supernatural



Louder than Words - Pink Floyd
Mais alto que palavras

Nós reclamamos e brigamos
Insultamos um ao outro à vista
Mas essa coisa que fazemos
Estes momentos juntos
Chova ou faça sol ou sob clima de tempestade
Esta coisa que fazemos

Com a beleza de quem está cansado da vida
Assumimos nossos lugares
Poderíamos amaldiçoá-lo ou cuidar dele e dar-lhe um nome
Ou ficar em casa ao lado da lareira, cheio de desejos
Alimentando o fogo
Mas estamos aqui pelo passeio

É mais alto que palavras
Essa coisa que nós fazemos
Mais alto do que palavras
A forma como ela se desenrola
É mais alto que palavras
A soma das nossas partes
A batida de nossos corações
É mais alto que palavras
Mais alto do que palavras

As cordas dobram e deslizam
À medida que as horas se vão
Um velho par de sapatos, seu blues favorito
Vou batucar o ritmo
Vamos com o fluxo, onde quer que ele vá
Nós estamos mais do que vivos

É mais alto que palavras
Essa coisa que nós fazemos
Mais alto do que palavras
A forma como ela se desenrola
É mais alto que palavras
A soma das nossas partes
A batida de nossos corações
É mais alto que palavras
Mais alto do que palavras

Mais alto do que palavras
Essa coisa que chamam de alma
Está lá com um pulso
Mais alto do que palavras
Mais alto do que palavras



quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Por que?


Em tempo algum senti tamanha semelhança entre mim mesmo e a Criatura do Dr. Frankenstein.
Tampouco reparei as demais sementes intrínsecas: a colcha de retalhos em que me transformei, pedaços de memórias, lágrimas, dores, risos e dúvidas.



Penny Dreadful S01E08 - Grand Guignol



"Os sonhos que tenho
de uma companheira

de outro ser,

olhando para esses olhos,
para esse rosto,

e não recuar.

Mas como isso é possível?

Pois o monstro
não está no meu rosto,

mas em minha alma.

Uma vez pensei que...

se fosse igual
aos outros homens, eu seria feliz.

E amado.

Mas a malignidade cresceu, sabe?

De fora para dentro.

E esse semblante despedaçado

meramente reflete
a abominação...

que é meu coração.

Oh meu Criador, por quê?

Por que não me fez
de aço e pedra?

Por que me permitiu sentir?

Eu preferia ser
o cadáver que era

do que o homem que sou.

Vá em frente.

Aperte o gatilho.

Será uma benção."





Mais do que amor...




"Mais do que amor, do que
dinheiro, do que religião,
do que fama, do que justiça,
me dê verdade."
Into the Wild

sábado, 25 de novembro de 2017

O nome da rosa...


Não me restam dúvidas: a Literatura pode, de fato, dar as respostas a aqueles que as procuram. 
Numa das madrugadas desta semana, obtive mais uma que, confesso, jamais havia percebido ter sido a causa de 24 anos de dores.




Todos os dias, desde a aurora da minha juventude, quando passei a dedicar minhas horas às leituras da Filosofia, tenho questionado as minhas certezas. Não há um dia sequer no qual este ritual não se repita.
Entretanto, somente beirando as quatro décadas de passagem pela crosta desse planeta, deparei-me com a causa de um - apenas um - dos meus tormentos.

Jamais havia tido um sonho tão real como o daquela madrugada. Enquanto eu conduzia um cavalo pela encosta de um penhasco, próximo do mar, eu a enxerguei a alguns passos de distância, próxima a uma curva. Estava imóvel, com o mesma roupa que a vi pela última vez. Ao me aproximar, acenou um adeus com a mão esquerda e seu corpo começou a se desfazer ao vento. Seus pedaços viraram cinzas e tomaram o céu.
Em vão, minha mão estendeu-se sem, sequer, conseguir tocá-las.

1993 - O início.

Quando se tem 15 anos e uma miríade de possibilidades perante a vida, não é comum refletir profundamente sobre os próprios atos e, principalmente, nas consequências que acarretarão por toda uma vida. Eu não fugi a essa regra.

Na minha escola, havia uma menina de origem humilde, bonita, magra, de cabelos negros lisos e compridos - os olhos eram mais negros ainda - que contrastavam com a alvura da pele, sempre vestida com o mesmo macacão jeans azul. Éramos de turmas diferentes, mas do mesmo ano, e estudávamos em salas próximas. Demorou algum tempo para que eu a notasse mas, por sua vez, eu não passei despercebido para ela. Foi preciso que um colega me alertasse o quanto era fitado pelos seus olhos.
Certa tarde, na fila da cantina, começamos a conversar e, então, em quase todos os intervalos (antigamente chamávamos de recreio) falávamos sobre os mais diferentes e absurdos assuntos do repertório da adolescência. A beleza que eu não enxerguei - e anos mais tarde vivi procurando - estava dentro dela. Não possuía o "padrão de beleza" física que me atraía, até porque eu já estava ressentido com as "desilusões" amorosas recentes até então. Naquela época, havia começado a jogar xadrez e era só esse o meu interesse no mundo.

Numa destas tardes, as cozinheiras da escola fizeram chocolate quente, daqueles encorpados que dá gosto de beber. Daquele tipo que só as avós sabem fazer para os netos nos dias frios de inverno, com o carinho característico de uma avó e o capricho de um profissional. Estava quente, mas isso não impediu que eu sorvesse o meu tão rapidamente. Eu já sabia que não poderia repetir pois, era uma regra.
Nós nos sentamos próximos e já com a minha caneca vazia, a alertei para que aproveitasse cada gole da sua. Ela bebeu um pequeno gole e o ofereceu a mim:

- Hummm... Está bem bom mesmo! 
- Pode ficar com o meu.

Lembro que, dentro de mim, metade dizia para aceitar e a outra, para negar a gentileza do presente.

- Pega. Tu gostas mais do que eu, pega - disse-me ela.

E no meu gesto egoísta, agradeci e o bebi como deveria ter feito como o meu. Enquanto bebia, fui observado o tempo todo. Mal sabia eu estar em frente a alguém que sentia mais e desejava mais a minha "felicidade" do que a sua própria, com uma simples caneca de chocolate quente... Não enxerguei o quanto aquela atitude era revestida de um carinho e sentimentos maiores do que propriamente o da amizade.

Dias depois, ela revelou a intenção que havia em seu coração: há muito receava dizer querer namorar comigo.

Lembro que, pela primeira vez, deixei a minha estupidez tomar a minha razão e respondi recusando a proposta, alegando um falso motivo. Na verdade, eu sentia vergonha da sua pobreza mas mal sabia que ali, o verdadeiro pobre era eu. Não fui sincero em dizer o que realmente eu sentia. Pensei que, mentindo, seria "menos pior" para ambos. Ledo engano o meu...

Mesmo com a minha recusa, continuamos nos encontrando no intervalo das aulas. Pouco tempo depois mudei de escola e, antes do fim do semestre, recebi um bilhete dela na última vez que nos encontramos, com a condição de que fosse lido apenas quando eu chegasse em casa. Depois disso, não houveram mais conversas, nem troca de olhares, nem gentilezas. Nunca mais nos vimos.

Naquele pedaço de papel pautado, assinado com a marca do batom de um beijo, estava escrito:

"Segue teu coração, pra onde quer que ele aponte."

1994 - 2017




A vida encontra meios de ensinar através de outras mãos aquilo que não aprendemos. Não importa o quanto tenhamos sido transparentes, sejamos fiéis, honestos, éticos... Nada disso vale qualquer coisa mesmo que sempre tenhamos falado a verdade para alguém que pensamos conhecer a ponto de querer construir uma vida juntos.

Passei quase 25 anos recebendo o mesmo veneno que dei a ela, de absolutamente todas as mulheres com quem mantive um relacionamento. Todo esse tempo, jamais enxerguei em mim mesmo o mal que havia feito a apenas uma. Não percebia o quanto a cada vez que eu dava a Verdade a quem quer que fosse, mais a Verdade se afastava de mim pois, aqui dentro, eu nunca havia deixado de carregar essa mentira. 




E parafraseando a obra de Umberto Eco...

... eu nunca mais a vi, nem nunca soube nada mais dela. Além do mais, agora que sou um homem velho, confesso que de todos os rostos do passado, o que vejo mais claramente é a da moça da qual nunca mais lembrei nestes vários longos anos. Ela foi a primeira que me ofereceu um amor sincero, embora eu não consiga lembrar seu nome...




terça-feira, 14 de novembro de 2017

Embriagai-vos





Embriagai-vos!
 

Deveis andar sempre embriagados. 
Tudo consiste nisso: eis a única questão. 
Para não sentirdes o fardo horrível do Tempo, 
que vos quebra os ombros, vergando-vos para o chão, 
é preciso que vos embriagueis sem descanso.
 

Mas, com quê? 
De vinho, de poesia ou de virtude. 
Como quiserdes. 
Mas, embriagai-vos.

E se, alguma vez, nos degraus de um palácio, 
na verde relva de uma vala, na solidão morna de vosso quarto, 
despertardes com a embriaguez já diminuída ou desaparecida, 
perguntai ao vento, à vaga, à estrela, ao pássaro, ao relógio, 
a tudo o que foge, a tudo que geme, a tudo o que rola, 
a tudo o que canta, a tudo o que fala, perguntai que horas são. 
E o vento, a vaga, a estrela, o pássaro, o relógio vos responderão:

- É a hora de vos embriagardes! 
Para não serdes escravos martirizados do Tempo, embriagai-vos! 
Embriagai-vos sem cessar! 
De vinho, de poesia ou de virtude! Como quiserdes!

Charles Baudelaire, Petits poémes en prose, 1869.

domingo, 12 de novembro de 2017

Ria da dor que lhe envenena seu coração





Recitar! ... enquanto tomado pelo delírio
Eu não sei o que eu estou dizendo mais
E o que eu faço!
E ainda... é dever... esforce-se!
Bah! Você não é um homem?

Sê você palhaço!
Vista sua fantasia
Passe pó no rosto
Aqui as pessoas pagam e querem rir
E se Arlequim
Roubar sua Colombina
Ria, oh palhaço, e todos aplaudirão!
Transformar em risos
Os espasmos e o choro
Em uma careta, o soluço
e a dor - Ah!

Ria, Palhaço
No seu amor em pedaços
Ria da dor que lhe envenena seu coração



Ainda que me afogue na dor, mesmo que o coração bombeie o veneno por todo meu corpo, meu riso não desvanecerá.







Thoreau



"O que será que, às vezes, tanto nos dificulta determinar o destino a dar aos nossos passos? Creio na existência de um magnetismo sutil em a Natureza, o qual, se cedermos inconscientemente, nos levará ao caminho acertado. Não nos é indiferente seguir este ou aquele caminho. Há o caminho certo; mas a negligência e a estupidez muito nos sujeitam a seguir o caminho errado. "
Henry David Thoreau